Na quinta feira passada, 23-10-2014, fez-se uma muito merecida homenagem ao Professor Duarte Gomes da FPCEUC, por ocasião da sua retirada como Coordenador do Mestrado Erasmus Mundus WOP-P.
Tive a sorte e a honra de ser convidada a representar os estudantes neste evento e partilho convosco a minha homenagem.
O discurso teve de ser dito em Inglês por consideração aos colegas estrangeiros que ali estavam, mas foi escrito originalmente em Português, pelo que partilho convosco ambas as versões.
Deixem-me acrescentar que foi uma cerimónia excecionalmente bonita e carregada de emoção. Teve contributos de colegas nacionais e internacionais, da FPCEUC, da Reitoria da UC, de estudantes, colegas e dos próprios filhos do Professor Duarte Gomes. Houve até a possibilidade de ouvir um disco de 1972 – na altura censurado pelo regime salazarista – produzido e cantado pelo próprio Professor Duarte Gomes.
Foi verdadeiramente memorável e muito merecido.
Good afternoon to all,
I’d firstly like to thank Prof Leonor Pais the honour and the privilege I was granted when she invited me to be present in this session and say a few words.
A great deal could be said about Professor Duarte Gomes, but there isn’t enough time; so paying a tribute to the storyteller that our – yes, emphasis on the “our” – Professor Duarte Gomes is, allow me to tell you a small episode.
It was the year 2008 and our student group – the first cohort of the WOP-P Erasmus Mundus – was sequestered to work in a very small village in Italy. This was a multicultural experience in sleep deprivation – oh, I mean, profound and intensive groupwork, that was called “Winter School”.
Because it was in Italy, a part of the Italian teaching staff was present, as were Professor Peiró and Professor Vincent Rogard – I’m sorry, I cannot recall if there was someone there from Barcelona.
I know this isn’t a big deal: the whole point of the Winter School was to create a sort of neutral space, international waters, where everyone could freely navigate and feel equally at home.
But God and Devil are in the details. And those days speaking 4 different languages at the same time, depending on who was there and what language would be better to debate, discuss, share and even confide, when allied to all the stress and demands, can take unsuspecting tolls.
And one day – I can never forget – me and my workgroup (where I was the only Portuguese) were in one of those rooms (yes, well, you have to understand that in Bertinoro we were secluded in a sort of convent, with formal, grandiose stone walled rooms). We were sitting on tall ornate chairs, around this dark, long, heavy wooden table – discussing the Program of Requirements, when someone knocked at the door.
The door opens, and to my surprise, it was Professor Duarte Gomes.
I cannot tell you if it was the sleep deprivation, the stress, or that I was among so many unfamiliar faces, but the unexpected emotion of seeing Professor Duarte Gomes there, our teacher, our coordinator – our! – was huge, and suddenly, almost magically, I knew everything was going to be ok.
It was in that day, I think, that I realized the importance that is sometimes subliminal, that this person had to me (and I dare say to my colleagues as well), and what he represented.
Before we knew he was there, we didn’t miss him (although we always kept very much in touch with the Coimbra staff); but after he was there, yes, we could finally say that Bertinoro was also our home, that we weren’t guests in someone else’s house.
This is due to a rare gift. While keeping his distance and authority, and even playing “devil’s advocate” or giving us a little sermon (I should know what I’m talking about), somehow we all know that Professor Duarte Gomes is mostly here to protect, help, guide and incentivise us.
His presence is effectively felt, without calling for attention. He wants to keep his distance, to make students autonomous, but we know he is present, and this presence is fundamental.
I’m sorry if my example was excessively personal.
I am sure that all other students would have stories and episodes to tell. Professor Duarte Gomes is a charismatic, unsurpassable figure.
I remember him tripping constantly on the small stage in the classroom, because he refused to lecture in different level than his students, literally. I can remember clearly seeing him argue with various people from here, and students, passionately and vehemently without ever taking things to a personal level: the true mark of people who care.
I remember him letting us know of a short deadline for a very hard assignment for him, and on the same day have him dine with us and sing at the end. Because his friendship was above making things easy for us, or our tantrums with him.
And I especially recall his proud, happy look towards his students, a strong hug at the end of each conquest, the way he always ended and email with “força” or “coragem”. I remember the day I argued my thesis, and how he made a point of formally welcoming my family to the session.
I know this isn’t a goodbye ceremony. Professor Duarte Gomes keeps on teaching those who are fortunate to study here. But it is still the end of and era, this passage of testimony of a project that owes him so, so much, the Erasmus Mundus WOP-P.
I know this was a long speech and although I said but a very small percentage of what I could have, some things don’t fit into words. But gestures can sometimes do a better job at this. So, I chose to finish this small homage with a mischief.
I know its not conventional, and I know its not my place, but I would like you all to help me give a proper ovation to our Professor Duarte Gomes, and that in this ovation you could place all the gratitude and tenderness for all that this great Man has done for us.
Thank you very much.
Boa tarde a todos,
Quero em primeiro lugar agradecer à Prof. Leonor Pais a honra e o privilégio que me concedeu ao convidar-me para estar presente nesta sessão e dizer algumas palavras.
Muito se poderia dizer sobre o Professor Duarte Gomes que não cabe no tempo nem no espaço desta pequena homenagem. Mas fazendo jus ao contador de histórias que o nosso – sim, nosso – Professor Duarte Gomes é, deixem-me contar-vos um pequeno episódio.
Em janeiro ou fevereiro de 2008, o nosso grupo de estudantes (a primeira promoção do WOP-P Erasmus Mundus) ficou sequestrada em trabalho, numa aldeola em Itália, numa multicultural experiência de privação de sono – quero dizer, de trabalho profundo e intensivo em grupo, a que se convencionou chamar de “Winter School”.
Sendo em Itália estava uma boa parte do staff docente italiano presente, o Prof. Peiró estava presente como coordenador, bem como o Prof. Vincent Rogard – e confesso que não me lembro se estava alguém de Barcelona ou não.
Eu sei que isto não é nada de mais: a ideia da Winter School era criar uma espécie de espaço neutro, águas internacionais onde todos navegassem livremente e se sentissem igualmente em casa.
Mas Deus e o Diabo estão nos detalhes. E aqueles dias a falar 4 línguas diferentes ao mesmo tempo, dependendo de quem estava e de qual a língua melhor para debater e discutir, partilhar e até confidenciar, aliado a um grande stresse e muita exigência desgastam de formas insuspeitas.
E um dia – não me esquecerei jamais – estávamos numa daquelas salas (sim, que em Bertinoro estávamos reclusos numa espécie de convento, com umas salas austeras imponentes em pedra), eu e o meu grupo (do qual eu era a única portuguesa) à volta de uma mesa de madeira pesada, com as cadeiras altas, a discutir o Program of Requirements, quando batem à porta.
A porta abre-se e para minha completa surpresa era o Prof Duarte Gomes.
E eu não sei se foi da privação de sono, do stress, do estar no meio de tanta gente desconhecida, mas a emoção de ver o Prof. Duarte Gomes ali, o nosso professor, o nosso coordernador – o nosso! – foi imensa e de repente, de forma quase mágica eu soube com clareza que ia correr tudo bem.
Foi nesse dia, acho, que percebi a importância que por vezes é subliminar, que esta pessoa tinha para mim (e arrisco-me a dizer, para os meus colegas) e o que ele representava.
Antes de sabermos que ele ia lá estar, não tínhamos dado pela sua falta (embora mantivéssemos contacto com o staff de Coimbra por email), mas depois de ele lá estar, sim, foi possível dizer que Bertinoro era um pouco nossa casa, que não éramos as visitas em casa de outrem.
Isto deve-se a um dom raro. É que mantendo a sua distância e autoridade, e mesmo fazendo de advogado do diabo e dando muito “chá” aos alunos (e eu sei bem do que estou a falar) de alguma forma todos sabemos que o Professor Duarte Gomes mais do que nada está aqui para nos proteger, ajudar, guiar, incentivar.
A sua presença faz-se efetivamente sentir, sem se fazer notar. Ele quer distanciar-se em prol da autonomia dos alunos, mas sabemos que ele está presente e essa presença é fundamental.
Desculpem se o meu exemplo é excessivamente pessoal.
Seguramente todos os outros alunos que ele tocou ao longo da sua carreira notável terão os seus próprios episódios e histórias para contar. O Professor Duarte Gomes é uma figura carismática e incontornável. Quem aqui, de entre os estudantes, é que pode dizer que nunca fez uma caricatura ou viu fazer uma caricatura do nosso professor? Só imitamos os trejeitos das pessoas que importam à consciência coletiva e que têm impacto, senão a imitação perde-se: não sabemos de quem se trata e também não nos interessa.
Dos primeiros tempos de WOP-P, lembro-me de os nossos colegas brasileiros dizerem expressões portuguesas com o gesticular do Professor, como se a expressão “é o fim da macacada” não pudesse ter outra forma de ser dita, para ter impacto.
Lembro-me de o ver tropeçar muitas vezes no palanque das salas porque se recusava dar aulas num nível diferente dos seus alunos – literalmente.
Lembro-me de vê-lo discutir com várias pessoas daqui e com alunos, com paixão e veemência sem nunca trazer as coisas para o nível pessoal: a verdadeira marca das pessoas que se importam.
Lembro-me de ele nos informar de um prazo apertado e de um trabalho muito exigente que tínhamos de lhe entregar e no mesmo dia ir jantar connosco e cantar no final. Porque a sua amizade nada tem de ver com os facilitismos ou as birras que fazemos.
E lembro-me muito especialmente, do seu ar feliz e babado com os seus alunos, do seu abraço forte no fim de cada conquista, da forma que acabava cada email com incitações de “força” e “coragem”. Lembro-me do dia em que defendi a minha tese de mestrado e da forma como fez questão de dar as boas vindas à minha família que estava presente em plena cerimónia oficial.
Eu sei que isto não é uma cerimónia de despedida. O Professor Duarte Gomes continua a lecionar os alunos que têm a sorte de estudar na FPCEUC. Mas não deixa de ser o fim de uma era, esta passagem de testemunho deste projeto que tanto lhe deve, o Mestrado Erasmus Mundus WOP-P.
O discurso já vai longo e ainda aqui não coube quase nada. Porque enfim, há coisas que as palavras não transmitem. Mas os gestos podem por vezes fazer um trabalho melhor nesta missão. Por isso escolhi terminar esta pequena homenagem com um atrevimento. Eu sei que não é convencional e não é o meu lugar fazer isto, mas queria pedir-vos que me ajudassem a dar uma enorme, gigante ovação ao nosso Professor Duarte Gomes e que nessa ovação colocassem toda a gratidão e carinho por tudo que este grande Homem tem feito por nós.
Muito obrigada.