Vivemos num mundo cada vez mais flexível e plástico, onde as nossas funções e a forma como fazemos as coisas são cada vez mais variáveis e mutáveis.
Se isto significa que temos o poder de fazer mais daquilo que gostamos, também significa que os nossos superiores têm o poder de nos dar mais daquilo que não querem fazer: gerir o nosso tempo de forma adequada é a melhor forma de garantir que as nossas carreiras seguem o rumo que mais nos preenche.
Há pouco tempo, num workshop sobre gestão de tempo, o formador, Pedro Brito da NOVA SBE, dizia que normalmente opta por fazer as coisas que lhe dão menos gozo primeiro e só depois parte para aquelas em que quer ser mais criativo e despender mais tempo.
Esta lógica faz sentido e é amplamente selebrada em várias áreas como por exemplo na Psicologia da Educação onde o “premark” (a distribuição de tarefas em que uma tarefa menos agradável precede outra agradável, que assim serve também de recompensa) é um pilar importante, ou por exemplo livros inteiros de gestão de tempo como é o caso do “Eat that frog” que alude à importância de se fazer as coisas menos agradáveis primeiro e por ordem de aversão (mais aversiva para menos aversiva).
O formador explicava com muita lógica que quando tem uma tarefa que nao quer fazer e que optou por adiar, essa tarefa lhe fica a “pairar” e nunca sai verdadeiramente da mente, o que o impede de se concentrar naquilo que está a fazer.
No entanto, eu tinha uma questão com esta abordagem que se prende com o seguinte: se fizermos tudo o que não queremos muito fazer primeiro, será que ficamos com tempo para fazer o que queremos? Não será que devemos priorizar as coisas que gostamos de fazer para que mais dessas tarefas nos calhem?
A resposta do formador foi que a minha questão estava a focar não a gestão de tempo, mas a gestão de carreira.
Isto, mesmo sem responder diretamente à minha pergunta, fez-me imenso sentido. De facto a gestão de carreiras passa num nível mais básico pelas decisões que fazemos em termos das tarefas a que vamos devotar a nossa atenção e empenho; a gestão de tempo passa pela alocação estratégica deste recurso escasso e irrecuperável que é o tempo às tarefas que nos darão mais gozo, oportunidades e frutos.
No entanto, confesso que ainda assim, as duas realidades não me parecem assim tão distintas e não deixo de achar que a gestão de tempo é, em grande medida uma (mais ou menos consciente) gestão de carreira.
Quando não decidimos estrategicamente como vamos despender o nosso tempo, alguém decide por nós, a vida vai acontecendo e usurpando com os seus eventos o nosso tempo pessoal e as nossas prioridades. O que sgnifica de um ponto de vista do trabalho, que a nossa carreira pode tomar rumos que não coincidem com aquilo que queremos.
O Pedro dizia que “quando não gerimos o nosso tempo, o custo é que mais cedo ou mais tarde nos despedidmos, se não for efetivamente, será emocionalmente – e eu nem sei o que é pior”. Isto acontece porque o nosso fracasso em gerir o tempo levou a que não consegussemos gerir adequadamente as nossas carreiras. No entanto, o inverso também é verdade: quando não gerimos a nossa carreira de modo a fazermos mais do que o nosso coração pede, temos menos vontade de fazer o nosso trabalho, procrastinamos mais e temos uma gestão de tempo menos eficaz.
Ou seja, de nada vale termos um excelente sistema de gestão de tempo com mil estratégias e apps se não estivermos alinhados com o que estamos a fazer, e isso não tiver a ver com a nossa missão, os nossos valores e as nossas paixões.
Chego à conclusão que tal como as atitudes, a gestão de tempo tem 3 componentes: comportamental, cognitiva e afetiva.
- No aspeto comportamental temos as técnicas de gestão de tempo: se usamos uma agenda em papel ou digital, quando planificamos o que quer que seja, etc.
- No elemento cognitivo temos a forma como criamos estratégias para atingir os nossos objetivos e como priorizamos as tarefas
- O componente afetivo tem a ver com o quanto gostamos da tarefa ou o quanto valorizamos aquilo que as tarefas pretendem atingir, o seu impacto
O último componente, que a meu ver é talvez o mais importante, está intimamente ligado à automotivação e à capacidade de resistência à frustração e é também aquele que menos se discute em diferentes fóruns (posso pensar em várias razões porque assim seja, mas não vem agora ao caso).
Há pouco tempo comecei a ler o livro do Simon Sinek, “Start with why”, e parece-me que esta lógica tão transversal se aplica também às nossas vidas: saberemos porque estamos a fazer o que quer que seja? Quando dizemos que uma tarefa é importante, qual é a medida dessa importância? O que fará com que uma tarefa seja importante?
E nestes critério de importância, qual a medida de “coração” que aqui está envolvida?
Ou seja, numa lógica de trabalho de conhecimento, onde o que é cada vez mais valorizado é a nossa criatividade e o valor acrescentado que cada um, pelas suas caracteristicas e competências únicas traz ao trabalho, a forma como trabalhamos, aquilo que fazemos é cada vez mais determinado por nós mesmos. Isto quer dizer que a nossa gestão de carreira está cada vez mais sob a nossa alçada individual e menos na responsabilidade de quem nos emprega. Cabe a nós descobrirmos o que nos faz sentir mais vivos e tentar estar envolvido mais com esse tipo de temas.
Já agora, como é que isso se traduz na decisão de qual a tarefa que devemos fazer primeiro? A resposta sem ser imediatamente evidente, é na realidade simples: a prioridade deve ir para os projetos que nos falam mais ao coração, mas dentro destes, idealmente devemos começar pelas tarefas que menos nos agradam, de modo a vivermos da forma mais leve e livre possível.